janeiro 04, 2012

Cerne

Ela vinha. Acho que foi depois daquele último cigarro queimar entre seus dedos. Alternava com os passos equilibrados no salto fino e os goles etílicos, no copo que segurava com a  mão direita. Ordenar voz, palavras e pensamentos ficava distante do esforço que podia fazer. Só dizia. E disse tanto, que quase não restou  verdade pra continuar. Sem nenhum critério de pudor entre o que amava e odiava, queria e evitava, disse. Não que lhe faltasse consciência. Isso é como  se desculpam. Sobrava-lhe  realidade. Lavou a alma. Misturava riso, sorriso e lágrimas, mas tudo era de uma razão só. Falou sobre alma, tesão, coragem, ousadia, medo, solidão, afeto, lembrança, desejo, e no final, antes de desfalecer pelo cansaço do desabafo, suspirou  longamente enquanto seus olhos, pesados, venciam a claridade da manhã.

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